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Iure Rodrigues: “O meu encontro com André Moura”

Iuri:

O Brasil começou a desmaiar, de novo, por volta das 19h30 dessa quarta-feira. André Moura salvou Michel Temer, denunciado como chefe de uma organização criminosa. Logo André que disse, semana passada em Sergipe, seu reduto, que ‘bandido bom é bandido morto’. Logo ele, o deputado federal que é réu em três ações penais.

Era noite de quarta-feira, na Avenida Paulista, entre a Haddock Lobo e a Bela Cintra. Eu decidira sair do trabalho e me juntar com amigos para assistir a votação sobre a denúncia da Procuradoria da República contra Temer. E preferi ir pra rua, porque é na rua que acontece grandes debates. Debates que acontecem a portas fechadas, com malas de dinheiro e fora da agenda oficial. Não é coisa boa. Nunca foi.

André riu. Não parou. Apenas riu, porque rir dos outros é sua pauta principal no congresso nacional.

Quando ele olhou para a TV, debrucei meus cotovelos no balcão. Um balcão visgoso de um bar qualquer de uma esquina famosa. Um líquido pastoso grudou meus braços por alguns segundos.

E, de repente, André ria – e com ele a memória de nossos desejos desencontrados e sequestrados. Não há nada mais triste na vida, André, do que rir de si mesmo.

Enquanto ele ria para a câmera deixando a mostra farturas de dentes brancos e bem alinhados, bocas banguelas e carentes choravam país afora.

Preciso retomar ao passado para poder dar conta do presente de quando conheci André Moura anos atrás.

Sou do interior de Sergipe e só desembarquei em Aracaju, cheio de sonhos e com um sotaque carregado, uma mochila azul nas costas e um cabelo de franja sempre precisando aparar, depois dos 18 anos.

Descobri a política logo cedo, e na Assembleia Legislativa de Sergipe fiz as primeiras tentativas de se fazer jornalismo. Eu era um estagiário na imprensa e André Moura um deputado estadual que ‘vezenquando’ nos encontrávamos pelos corredores ou elevadores privativos do prédio. Nem sempre pude entrar no mesmo elevador que André, porque o seu perfume me engolfava e me dava vontade de vomitar.

André Luís Dantas Ferreira, mais conhecido como André Moura é nascido em Salvador, mas fez a sua base eleitoral no estado vizinho, em Sergipe.

Ganhou notoriedade através dos pais. O pai, conselheiro do tribunal de contas. A mãe, deputada estadual por vários mandatos. Foi prefeito de Pirambu, município do litoral sergipano, duas vezes. Elegeu-se deputado estadual em 2006, e em 2010 para deputado federal, tendo sido reeleito em 2014. Da carreira vitoriosa nas urnas, sempre com polêmicas e processos na justiça, André Moura é réu em três ações penais no Supremo Tribunal Federal (STF), investigado por formação de quadrilha e crimes de responsabilidade. Além disso, é investigado em outros três inquéritos no Supremo, sob suspeita dos mesmos crimes e também de peculato (apropriação de dinheiro ou bem público em razão do cargo ocupado); fraude de licitações; desvio de recursos públicos; e tentativa de homicídio.

Essa é a identidade de André que sempre evocou em mim. Sem ideologia, aspirante a todos os partidos e lados, e um pau mandado do presidiário Eduardo Cunha. Tai a delação de Lúcio Funaro que não me deixa mentir.

Nem sempre era fácil pra mim alcançar os debates nas sessões nesse tempo em que eu ainda era um menino vindo do interior para a capital. André Moura sempre foi um deputado ausente, sem projetos, sem perspectivas, andava de um lado a outro com o celular no ouvido e sempre fugindo da imprensa.

E lá ia eu correndo ofegantemente achando que, daquela vez, tinha conseguido escapar do deputado, quando a figura dele se materializava diante de mim, com um sorriso sinistro, um olhar arregalado e uma testa grande sempre suada.

O Brasil está machucado, mas continua em pé, André. Machucado, mas em pé.

André Moura e os demais golpistas só continuam sorrindo da gente, com as suas gigantescas bochechas, porque somos nós que os mantemos vivos. Através do voto.

André Moura nunca me cheirou bem. Nem mesmo na época em que seu perfume fazia a adrenalina no elevador da Assembleia Legislativa do Estado de Sergipe. 2018 te espera.

Iuri Rodrigues é sergipano de Lagarto, jornalista e autor do livro “Um lugar para respirar”

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