PUBLICIDADE

Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors
post
page

PUBLICIDADE

Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors
post
page
Publicidade

Artistas protestam contra alteração na Rouanet proposta por Sérgio Sá Leitão

Sérgio Sá Leitão: ministro se pronunciou sobre 'Queermuseu' e performance no MAM-SP - Divulgação/Minc/Janine Moraes

Em uma semana em que os debates sobre os limites da arte se tornaram mais acalorados e saíram da esfera dos museus para a política, o ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão, atirou mais lenha à fogueira. Conforme adiantou nesta quinta-feira a coluna de Ancelmo Gois, no GLOBO, o ministro incluiu um artigo na minuta da regulamentação da Lei Rouanet que veta a apresentação de propostas que “vilipendiem a fé religiosa, promovam a sexualização precoce de crianças e adolescentes ou façam apologia a crimes ou atividades criminosas”. Para representantes de diferentes áreas do setor, a inclusão do artigo na lei abre um perigoso precedente para a censura.

Sérgio Sá Leitão: ministro se pronunciou sobre 'Queermuseu' e performance no MAM-SP - Divulgação/Minc/Janine Moraes
Sérgio Sá Leitão: ministro se pronunciou sobre ‘Queermuseu’ e performance no MAM-SP – Divulgação/Minc/Janine Moraes

— Achei que vivêssemos em um Estado laico, mas o Brasil se torna cada vez mais acanhado. Estamos presenciando uma espécie de ditadura coletiva, muito próxima do que foi o início do nazismo. A Alemanha dos anos 1930 também utilizou a publicidade para criar um estado de histeria coletiva, para conduzir as pessoas para um sentimento fanático — protesta o artista visual Ernesto Neto. — Este tipo de censura vai inibir a criação e a imaginação, e qualquer produção depende disso para existir. É triste ver um país com tamanha riqueza que abre mão de suas referências multiculturais para se manter ligado apenas às europeias, e de uma Europa que nem se reconhece mais.

Para Eduardo Barata, presidente da Associação dos Produtores de Teatro (APTR), a medida parece “censura travestida de legalidade”:

— Tudo depende do ponto de vista. Fazer uma peça em que Jesus Cristo é travesti é vilipendiar a fé religiosa? Se a novela da Gloria Perez for transcrita para o palco, isso vai configurar apologia ao crime? Uma obra de arte não pode ter esse tipo de amarra. Nossos projetos são avaliados por técnicos. Com uma recomendação dessas vai ser difícil aprovar qualquer coisa. O único acesso que temos a fomento de cultura é pela Lei Rouanet. Vamos ter que ir à Justiça?

BANCADA EVANGÉLICA

O ministro também se envolveu em outra polêmica: em vídeo publicado nesta quinta-feira pela repórter Juliana Braga, da coluna de Lauro Jardim, do GLOBO, Sá Leitão comenta, numa reunião com a bancada evangélica da Câmara dos Deputados, organizada pelo deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), que, no seu entender, a performance “La bête”, no MAM-SP — na qual uma criança acompanhada da mãe tocou nas mãos e pés do coreógrafo Wagner Schwartz, nu — “apresenta um claro descumprimento do que determina o Estatuto da Criança e do Adolescente”.

Sá Leitão também falou da exposição “Queermuseu”, suspensa em Porto Alegre, ao defender a necessidade da classificação indicativa em eventos de artes visuais. O ministro, que admitiu não ter visto a mostra e somente ter tido acesso a imagens isoladas, disse que não havia formado juízo sobre seu conteúdo, mas que “cabe às pessoas que, porventura, tenham se sentido ofendidas que recorram à Justiça, e a Justiça que se pronuncie”.

— É uma posição muito infeliz. Ainda que ele a coloque como uma opinião pessoal, dita pelo ministro da Cultura tem outro peso. Ele está fazendo um juízo de valor sobre uma exposição que não viu, fazendo coro a esta cruzada moralista. Abre um precedente perigoso — critica Gaudêncio Fidélis, curador de “Queermuseu”.

Para o jurista e professor Lenio Streck, a sugestão do ministro agrava o processo de judicialização da arte, que resulta em episódios como o da peça “O evangelho segundo Jesus, Rainha do Céu”, com a atriz trans Renata Carvalho no papel de Jesus, impedida de ser apresentado no Sesc de Jundiaí (SP), em 15 de setembro.

— Há uma espécie de colonização do cotidiano pela Justiça. Estamos criando cidadãos de segunda classe, tutelados pelo estado. Há uma subjetividade na arte que não cabe ser avaliada pela Justiça, o bom ou mau gosto não está previsto em lei. Essa interpretação, em última instância, acaba sendo feita por quem julga o caso. Depende da subjetividade do magistrado.

CLIMA HOSTIL

Procurado pela reportagem, Sérgio Sá Leitão não se pronunciou para entrevista até a conclusão desta edição. À coluna de Ancelmo Gois, o ministro enviou nota ressaltando que o Código Penal já considera crime o que foi destacado no artigo: “O que eu combinei com a bancada cristã é que, como estes temas já são configurados como crime, vamos reproduzir, sem uma vírgula a mais ou menos, na normatização da Lei Rouanet estes artigos do Código Penal”.

Sobre o vídeo da reunião, enviou nota à coluna de Lauro Jardim afirmando ter manifestado opinião “sobre este assunto enfatizando que foi em caráter pessoal, pois não sou juiz, jurista ou membro do Ministério Público; nem psicólogo” e que a “interação física de uma criança com um adulto nu que não é seu pai ou mãe, por indução direta da mãe, na frente de dezenas de pessoas, independentemente do contexto específico, configura uma situação potencialmente prejudicial ao desenvolvimento emocional dela e configura o descumprimento em maior ou menor grau dos artigos do Estatuto da Criança e do Adolescente”.

Em meio ao clima hostil, um protesto com cerca de 30 pessoas no Palácio das Artes, em Belo Horizonte, que sedia a mostra “Faça você mesmo sua Capela Sistina”, com obras de Pedro Moraleida (1977-1999), levou medo a frequentadores. O ato foi encabeçado pelo deputado estadual João Leite (PSDB), derrotado na última eleição para prefeitura da cidade. No Rio, um grupo de artistas da mostra “Curto-circuito” reuniria cerca de 50 artistas, performances e duas peças teatrais no Castelinho do Flamengo, acusou a prefeitura de censura após a sua suspensão. A Secretaria Municipal de Cultura alegou uma pane elétrica no local como razão para o adiamento da abertura.

Publicidade
Publicidade