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Transporte público é palco de artistas e berço de novas amizades

ONIBUS

O sol ainda nem despontou no horizonte e lá vão eles cruzando as ruas e avenidas da capital de Sergipe. De parada em parada, recebem os passageiros [quase sempre os mesmos rostos] que têm pressa para iniciar mais uma jornada de trabalho e sem atrasos.

Ao longo do dia são mais de 204 mil pessoas circulando nos 596 ônibus do sistema de transporte público da Região Metropolitana de Aracaju (SE) e muita gente encontra neste espaço oportunidade para fazer amizades e até sobreviver.

Entre os usuários, o cabo de turma de um condomínio do município da Barra dos Coqueiros (SE), Samuel Rodrigues, que leva cerca de 70 minutos da casa onde mora no Conjunto Eduardo Gomes, em São Cristóvão, até o local de trabalho. “Saio de casa por volta das 4h40 da madrugada, porque preciso entrar no serviço às 7h. Pego três ônibus até chegar ao meu destino”, conta.

No mês de maio, durante os nove dias de paralisação dos caminhoneiros em Sergipe houve desabastecimento de combustível nas empresas de ônibus. A situação provocou uma redução da frota em 30%, nos dias normais, e pela metade nos feriados e finais de semana. Para Samuel foi preciso um pouco mais de paciência para chegar ao trabalho.

“Sem o número de ônibus adequado, a minha rotina foi bagunçada. Precisei me acordar mais cedo para evitar chegar atrasado, porque as linhas já não passavam com a mesma frequência e ainda precisei gastar mais com o táxi lotação. O tempo de viagem passou de 70 minutos para quase 2horas”

Há cerca de três anos, o encarregado de produção de uma empresa multinacional, Jeferson Melo, leva cerca de 25 minutos pra fazer o percurso do Terminal Maracaju, na Zona Sul de Aracaju, até a sede da empresa no Conjunto Marcos Freire I, em Nossa Senhora do Socorro (SE). Depois de tanto tempo usando a mesma linha, ele conta que até os laços de amizade acabam surgindo.

“Geralmente são os mesmos passageiros, colegas de empresa, motoristas e cobradores. De tanto a gente se encontrar, acaba puxando assuntos sobre trabalho, família, os problemas do transporte público. Rola até uma camaradagem, se o ponto fica um pouco mais distante da empresa, eles dão um jeitinho para parar na porta, até porque o local onde trabalho é um pouco perigoso”, explica Melo.

E enquanto seguem viagem, eles também encontram outros trabalhadores que enxergam os usuários como potenciais clientes. “A gente encontra pessoas fazendo de tudo um pouco para arrancar de nós uns trocados. Já comprei caneta, doces e até já vi gente fazendo show dentro do ônibus. Neste último caso, é até bom para relaxar nos dias de trânsito pesado”, aponta o aposentado José Carlos Moraes.

Pocket show itinerante

Quem circula nas linhas que passam pela região central de Aracaju já deve ter se deparado com a voz do aracajuano/estudante do quinto período de Medicina, da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Maxwell Nascimento Santos, que depois de ser desafiado pela namorada colocou em prática um desejo antigo.

“Falei que tinha um sonho de tocar em metô. Como não temos em Sergipe, ela me desafiou a começar naquele momento nos ônibus. Desafio aceito, acabei pegando gosto, devido a receptividade da população, e acabei transformando isso em uma profissão. De lá para cá, já se passaram dois anos. No começo, ela era a responsável por receber a gorjeta. A gente conta também com a parceria dos cobradores e motoristas que são legais comigo, abrindo as portas dos ônibus para fazer meu show”, conta.

Com o violão nas mãos, ele quebra a rotina da viagem enfrentando o desafio de se equilibrar com o balanço e freadas do veículo. Tem ainda as situações que os passageiros vão chegando, se apertando e nem sempre dá para tocar de forma confortável. Mas quando sobra espaço, Maxwell não hesita em sentar e dá um show de acordes para o público itinerante e generoso.

“A maior arrecadação que já tive foi de R$ 50, só uma pessoa me deu 20. Foi o dia que mais fiquei impressionado com a generosidade das pessoas. O dinheiro que vem das doações nos ônibus ajuda a pagar minhas dívidas. No início, também ajudava aos meus pais”

O filho de caminhoneiro e de uma dona de casa tem pouco tempo para mostrar o talento para o público, que muitas vezes sobe em um ponto e deixa o veículo a menos de um quilômetro. “As pessoas aplaudem, dão parabéns e incentivam. Também têm aquelas que mandam mensagens pelas redes sociais dizendo que no dia que me ouviu no ônibus a canção tocou, que ajudou a melhorar o clima e até salvou a vida. Isso é muito bom”, comemora.

“Se tudo que eu fizer for só pra mim não vale de nada. A medicina é a possibilidade de mostrar que alguém como eu pode ser o que quiser. E não é a história de superação que interessa e sim aquilo que foi feito para se superar. Eu tenho essa pretensão, esse sonho, de que com minha formação eu posso inspirar outras pessoas”, diz.

E completa. “Acredito que a música tem a responsabilidade de trazer uma perspectiva e não só entreter. Vivemos na sociedade líquida, citada pelo sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman, em busca de entretenimento e auto-realização egoísta. Em síntese, pra mim, música e medicina são os instrumentos que eu tenho para contrapor essa realidade, que para mim não faz sentido”, afirma.

Por causa do curso de medicina, Max Cuscuz, nome artístico adotado pelo rapaz, diminuiu as apresentações nos ônibus, que atualmente se limitam ao período de férias da universidade. E para não ficar sem renda, ele dá aulas particulares, monitoria, palestras e ainda encontra tempo para se apresentar em barzinho.

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